Murakami não era exatamente um hit aqui em casa. Há mais de dez anos, eu havia lido o romance Após o anoitecer e não tinha me empolgado tanto. O livro até acabou indo parar em algum sebo por aí, mas não lembro exatamente quando foi que o troquei. Mais recentemente, Natasha leu Sul da fronteira, oeste do sol e dizer que ela não gostou do livro seria uma afirmação tímida. O exemplar também foi despachado em algum momento.
Este mês, por conta da nossa parceria com a Companhia das Letras, recebemos Primeira pessoa do singular, o novo livro de contos do autor japonês, originalmente publicado em 2020. Resolvi dar uma segunda chance a Murakami porque, afinal de contas, o maior nome contemporâneo da literatura japonesa não pode, não deve ser resumido a uma única experiência de leitura. Ao ler o primeiro conto, fiquei muito feliz ao notar que havia de fato gostado bastante. A impressão se intensificou no segundo conto, “Nata”, ainda melhor que o primeiro. O terceiro conto, “Charlie Parker Plays Bossa Nova”, é uma pequena obra-prima. O quarto conto, “With The Beatles”, é uma pérola romântica e melancólica. Vocês podem imaginar que, a esta altura, eu já tinha virado fã, se não do autor, pelo menos do livro.
A voz narrativa de Murakami é tranquila, leve, pausada. Ela alcança profundidades inesperadas com pouco esforço aparente, o que é sempre uma virtude em escritores de histórias curtas – quem fez isso melhor que Katherine Mansfield ou Lygia Fagundes Telles, por exemplo? As constantes referências a música, não apenas no conto que tem a beatlemania como pano de fundo, mas no conjunto como um todo, certamente elevam a leitura, caso você se deixe levar e ouça algumas das obras mencionadas. Li o conto “Carnaval”, por exemplo, ouvindo a obra homônima de Schumann e descobri um tesouro que me era desconhecido.
E o melhor de tudo é que, depois de ter contato com esses belos contos, podemos dizer que Murakami talvez seja um hit aqui em casa, sim.