Lord of the Flies

Publicado em 1954, Lord of the Flies é um clássico da literatura em língua inglesa do pós-guerra. Uma alegoria da natureza humana e das relações sociais em estado bruto, o curto romance de William Golding acompanha o destino de um bando de crianças que, em decorrência de um acidente de avião, se encontram sozinhas em uma ilha e precisam se organizar entre elas mesmas, sem ajuda externa ou orientação de adultos.

O enredo é simples, quase repetitivo. No entanto, cada evento tem significado, cada personagem desempenha um papel e tudo se interconecta: até os objetos têm seu propósito simbólico. Os símbolos, bem como os níveis de interpretação possíveis, são incontáveis. A começar pela figura que dá título ao livro: o tal Senhor das Moscas. Produto da caça dos meninos, a cabeça de javali fincada numa estaca atrai cada vez mais moscas e, de acordo com o narrador, é “a única coisa que prospera na ilha”. Como são dois os grupos de garotos que se organizam a partir de duas figuras de liderança, a tal cabeça acaba simbolizando a rivalidade tribal, o poder da natureza sobre os desígnios humanos, a propensão à idolatria que é própria da humanidade, o sacrifício e a decadência, ou simplesmente a maldade (“the darkness of man’s heart”, para usar uma expressão que aparece no penúltimo parágrafo do livro, num claro aceno a Conrad).

Em tempos de guerra (apesar de que todos os tempos são tempos de guerra), quando um líder de nação ameaça abertamente começar um conflito nuclear, ler Lord of the Flies é entender que às vezes as cisões se dão sobretudo no plano da vaidade: Jack não contesta a liderança de Ralph por discordar das decisões sobre a carne de javali, simplesmente; ele contesta porque quer ser o líder. E o pior é que sempre foi assim: basta ver a história da Europa e seus povos e coroas em eternos embates.

De certa forma, somos todos crianças numa ilha, brincando de sociedade, sem supervisão.

Sou cientista social e antropóloga formada pela Unicamp. Sou pós-graduada em Gestão Escolar pela USP-Esalq e sou professora/coordenadora em uma escola internacional. Tenho muitas paixões, de caderninhos de anotações a corrida de rua, de Jorge Luis Borges a RuPaul's Drag Race, de Iga Swiatek a água com gás. Sou autora de Quarto mapa (2021) e Hi-fi da tarde e haicais noturnos (2023).

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