Sobre Borges

Jorge Luis Borges me leva a mundos imaginados onde a ciência nada mais é que outra mitologia fantástica. Ao fundo dos séculos, em que ecos dos primeiros versos jamais escritos se divisam e ressoam como choque de espadas. Guerras travadas por vikings e suas canções de vitória em língua angulosa de alvorada, recém inventada.

Borges morreu no mês seguinte ao do meu nascimento. Nascido no último suspiro do século anterior, o longo XIX, alcançou veneráveis 86 anos de idade; isso é algo que me traz um sabor de distância e proximidade que não conflitam. Penso em Borges e penso em três mundos: o meu, o nosso – compartilhado pelo espaço de um mês – e o dele.

No meu tempo, testemunho a vertigem da maior biblioteca engendrada pelo homem, muito semelhante àquela postulada por Borges em seu O jardim de veredas que se bifurcam. No nosso tempo sobreposto, vejo o limiar dessa imensa biblioteca em todos os acontecimentos que corriam silenciosos rumo à explosão que presenciei. No tempo de Borges, por fim, consigo adivinhar grandes volumes de papel, volumes quase místicos, quase adâmicos em sua antiguidade, repletos de segredos já esquecidos.

São esses segredos que Borges me traz, embrulhados em finíssima literatura. O grande poeta predestinado, cuja cegueira chegou como se delicadamente sobre o ombro lhe pousasse um falcão de caça (esta imagem é do próprio Borges), enviado por deuses cientes da maestria do caçador (esta suposição é minha).

Sou cientista social e antropóloga formada pela Unicamp. Sou pós-graduada em Gestão Escolar pela USP-Esalq e sou professora/coordenadora em uma escola internacional. Tenho muitas paixões, de caderninhos de anotações a corrida de rua, de Jorge Luis Borges a RuPaul's Drag Race, de Iga Swiatek a água com gás. Sou autora de Quarto mapa (2021) e Hi-fi da tarde e haicais noturnos (2023).

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