A poesia miúda e grande de Manoel de Barros

“Minhocas arejam a terra; poetas, a linguagem.”

Poeta da paisagem descalça de meninos à beira de um riacho coaxando sapos, da vida miúda dos bichos e das plantas (versa até sobre a metafísica das lesmas, a intimidade dos tatus, o amor dos quero-queros), verdadeira minhoca arejando a terra. Acha reentrâncias nos vocábulos onde se esconde a nudez maior dos significados, aquela intimidade da palavra onde ela tem cócegas, aquele parafuso onde ela se desmonta, aquela temperatura em que ela se derrete. Inspiração de Guimarães Rosa (a quem sua poesia sabia a um “doce de coco”), coroado por Drummond como maior poeta brasileiro, Manoel de Barros, rei de seu nadifúndio, cruza transpedregosamente um caudaloso rio de matéria de poesia com suas ferramentas mais insignes:

“1 abridor de amanhecer
1 prego que farfalha
1 encolhedor de rios – e
1 esticador de horizontes.”

“Eu toco minha vida com 70 flautas.”

“Plantar goiabeira com máquina-corpo seria defecar no campo ou no quintal depois de comer goiaba com caroço. Dessa forma, aparecem pelos campos muitos pés de goiaba plantados com o corpo.”

“Com pedaços de mim eu monto um ser atônito.”

“Rosa gostava muito do corpo fônico das palavras.
Veja a palavra bunda, Manoel
Ela tem um bonito corpo fônico além do propriamente.”

“Morrer é uma coisa indestrutível.”

Sou cientista social e antropóloga formada pela Unicamp. Sou pós-graduada em Gestão Escolar pela USP-Esalq e sou professora/coordenadora em uma escola internacional. Tenho muitas paixões, de caderninhos de anotações a corrida de rua, de Jorge Luis Borges a RuPaul's Drag Race, de Iga Swiatek a água com gás. Sou autora de Quarto mapa (2021) e Hi-fi da tarde e haicais noturnos (2023).

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