Primeira mulher americana a ganhar o Nobel de Literatura, Gabriela Mistral (pseudônimo de Lucila Godoy Alcayaga) nasceu em Vicuña, na província de Elqui, norte do Chile, em 1889. Em uma vida que a levou a conhecer inúmeros países (a certa altura, depois da fama, Mistral abandonou a profissão de educadora para desempenhar cargos diplomáticos na Europa), dizem que foi justamente no Brasil, em Petrópolis, que recebeu a notícia do Nobel, em 1945.
Professora, poeta, feminista, diplomata, nobelizada (em entrevistas, Bolaño já se referiu a Mistral como “uma extraterrestre”): essa mulher à frente de seu tempo participou inclusive da educação de um tal Neftalí Reyes, que mais tarde viria a ser conhecido mundialmente como o também nobelizado Pablo Neruda.
Curioso notar que a obra desses dois grandes poetas parece brotar da geografia do Chile, esse país de território peculiarmente estreito que segue a cordilheira andina de cima a baixo e ali se encrava, em seus múltiplos tipos de clima, entre ela e o Pacífico.
Poema de Chile, em especial, é uma celebração da natureza e cultura chilenas a partir do caminho de um menino, um cervo andino e um fantasma, que percorrerão o país de norte a sul, numa espécie de peregrinação chauceriana em escala. Publicado dez anos após a morte da autora, a linda edição que tenho em mãos (da editora La Pollera, 2015, comprada na bela livraria Antartica, em Santiago) é uma das configurações possíveis da coletânea e foi organizada por Doris Dana, amiga e testamenteira de Mistral.
Com poemas chamados “Viento norte”, “Cordillera”, “Atacama”, “El valle”, “El mar”, “Valparaíso”, “Magallanes”, seguimos nossos três peregrinos através de paisagens tipicamente chilenas, do extremo norte à Patagônia, neste que talvez seja o exemplar mais épico da poesia desse país de dois prêmios Nobel de Literatura. (Ainda não há traduções de Poema de Chile para o português; nesse idioma, podemos encontrar apenas algumas antologias e poemas selecionados de Mistral).