Na década de 1980, na cidade de Cruzeta, no Rio Grande do Norte, um morador idoso começou a cultivar, na sua hortinha de boldo, carqueja e outras ervas terapêuticas, uma bonita flor, cheirosa e de propriedades medicinais. Os vizinhos foram pedindo mudinhas daquela planta que chamavam de liamba e dentro de pouco tempo a comunidade estava impressionada com sua eficácia no tratamento de dores crônicas, epilepsia, ansiedade e vários outros desconfortos. Em 1996, uma denúncia anônima levou a polícia a investigar o caso e plantas enormes de Cannabis foram achadas em vários jardins dos habitantes de Cruzeta. As plantas foram arrancadas pela polícia com estardalhaço nacional, os idosos ficaram privados de seus chazinhos e, além de tudo, tiveram que frequentar cursos de alerta sobre os perigos da maconha.
A história seria engraçadinha, até, se não fosse parte de um quadro trágico de desinformação, preconceito, hipocrisia, histeria moral e interesses escusos.
A grande massa da humanidade que habita o século 21 é viciada em álcool e açúcar, substâncias infinitamente mais perigosas, mas é a Cannabis que carrega o estigma de droga marginalizante. “Proibicionistas geralmente consideram droga aquilo que os outros gostam e eles não”, afirma Sidarta Ribeiro a certa altura de seu livro.
Este documento corajoso de um dos mais importantes neurocientistas da atualidade, nesta bonita edição da Editora Fósforo, é uma excelente adição ao rol de obras de divulgação científica no país. Um pequeno manual informal de pesquisa recente sobre a Cannabis, um relato pessoal e uma ode, enfim, às plantas mais demonizadas e estigmatizadas da nossa civilização, As flores do bem é um livro iluminador.
