Em É a Ales, do mais novo condecorado com o Nobel, o norueguês Jon Fosse (o prêmio foi anunciado na semana passada; recebemos o livro da Companhia das Letras no dia seguinte. Um salve à editora, aliás, que consistentemente monitora a produção de livros no mundo inteiro e coloca no mercado brasileiro edições lindas e bem traduzidas), vemos alguém que vê alguém olhar pela janela, para o fiorde, o mar e o frio norueguês. É Signe que olha para Asle, o marido que saiu de barco há mais de vinte anos e nunca mais voltou. O presente se mistura com o passado (seria possível pensar na dinâmica das ondas, em que uma quebra por cima enquanto outra repuxa por baixo) e o movimento resultante é algo que faz parte da tessitura dos fatos humanos, vibrando desde o subterrâneo; em outras palavras, uma profunda revelação – aquilo que a literatura faz melhor que qualquer outra arte.
Com uma estrutura circular e repetitiva que lembra momentos de Thomas Bernhard, Fosse constrói uma história que é ao mesmo tempo um delicado relato familiar e um poderoso conto sobre a perda, a sina humana da tragédia.
Chorei muito, apesar do privilégio de poder ter lido o livro inteiro de um só tapa (são 108 páginas, nesta tradução de Guilherme da Silva Braga), de frente para o mar da praia de São Gonçalo, em Paraty, em um dia azul de sol e tranquilidade. Talvez a proximidade da água tenha me sensibilizado e aberto meu coração para receber a história de Signe, Ales, Asle e o menino Asle, mas o fato é que tive a sensação de estar diante daquele tipo de arte capaz de captar coisas tão imensas como o mar e isso sempre me faz chorar.