As entrevistas da Paris Review

Esse primeiro volume de coletâneas de entrevistas da Paris Review foi um pequeno tesouro que achei sem querer na biblioteca do IFCH, há uns anos. Retirei o volume para ler a do Borges, mas acabei lendo todas as catorze mesmo por causa do naipe dos entrevistados e da qualidade das conversas (a “entrevista da Paris Review”, que começou a ser publicada em 1953, marcou a literatura do século XX e hoje é uma espécie de subgênero, um feito de consagração reservado apenas aos grandes). Gostei tanto da leitura que, recentemente, adquiri os dois volumes editados no Brasil pela Companhia das Letras.

Legal passar por um Faulkner quase messiânico, um Capote estrelíssima (Lady Gaga de seu tempo), um Hemingway distribuidor de coices (o repórter fazia perguntas e o Hemingway falava na lata que a pergunta era desinteressante ou chata), um Borges exageradamente modesto como sempre, retornando de maneira muito familiar às infalíveis sagas nórdicas e seus autores preferidos, uma simpaticíssima senhora Doris Lessing e até um Billy Wilder canastrão da era de ouro de Hollywood.

Para quem gosta de literatura, é um livro hipnótico. Todos esses escritores, tão diferentes entre si mas tão semelhantes no que diz respeito à capacidade de observar e plasmar, têm lições interessantíssimas a dar. E não consigo imaginar algo melhor que passar a tarde conversando com alguns dos maiores ficcionistas do mundo sobre seus processos criativos e suas relações com a literatura e com a vida.

Seguem uns trechos:

“Porque um romance é o único lugar do mundo onde dois estranhos podem se encontrar em absoluta intimidade. Leitor e autor fazem juntos o livro. Nenhuma outra arte é capaz disso. Nenhuma outra arte é capaz de capturar a interioridade essencial da vida humana.” (Paul Auster)

“O objetivo de todo artista é deter o movimento, que é vida, por meios artificiais, mantendo-o fixo, de modo que, cem anos depois, quando um estranho olhar para aquilo, ele se movimenta de novo, por ser vida. Como o homem é mortal, a única imortalidade possível para ele é deixar algo atrás de si que seja imortal porque sempre vai se movimentar.” (William Faulkner)

“O dom mais essencial para o bom escritor é um detector de merda, embutido e à prova de choque. É o radar do escritor, e todos os grandes escritores tiveram o seu.” (Ernest Hemingway)

“Não dou conselhos. Você não acredita… Sei que tudo nessa área é clichê, tudo já foi dito, mas você simplesmente não acredita que irá envelhecer. As pessoas não se dão conta de como a gente envelhece rápido, também. O tempo passa depressa.” (Doris Lessing)

“É muito importante para um escritor ter o que dizer, na minha opinião. Se um autor estiver convencido de que é honesto e tem algo fundamental a dizer, é muito difícil que seja um mau escritor. Sente-se obrigado a passar, a transmitir suas ideias de modo claro. Por outro lado, se um escritor nada tem a dizer, mesmo que maneje as ferramentas da escrita, será um escritor menor.” (Primo Levi)

Sou cientista social e antropóloga formada pela Unicamp. Sou pós-graduada em Gestão Escolar pela USP-Esalq e sou professora/coordenadora em uma escola internacional. Tenho muitas paixões, de caderninhos de anotações a corrida de rua, de Jorge Luis Borges a RuPaul's Drag Race, de Iga Swiatek a água com gás. Sou autora de Quarto mapa (2021) e Hi-fi da tarde e haicais noturnos (2023).

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